04/12/2013
''AI!!! QUE SAUDADE ME DÁ !!!"
Pretendo descrever com AMOR – mas também com HUMOR
– as lembranças que guardo da querida professora de matemática, Dnª Maria
Augusta. Espero alcançar tal objetivo.
Nunca fui aluno “brilhante” em Matemática...
Calculadora portátil não era permitido – e mesmo que fosse, só o Antônio Pio,
irmão do Gêra que vendia a preço de ouro, pois era o único que se arriscava ir
no Paraguai pra buscar. E até hoje só conheço de cor as tabuadas de 2, de 5 e
de 10...
No Ginásio acabaram-se os "Problemas" –
os tais exercícios de matemática que aprendíamos no Grupo, que eram umas
histórias de 2 ou 3 linhas e depois vinha um “quadradinho” por linha, na frente
de cada etapa dos cálculos.
A coisa mudou bastante no Ginásio e pra começar,
mudou até de nome: Virou "Equação"... e até hoje penso que Dnª Maria
Augusta pegou pesado com a gente... Seu modo de ensinar era “ESTILO MILITAR”, e
a primeira visão nos deixou apreensivos: Surgiu uma senhora corpulenta, sem
nenhum traço de sorrisos no rosto. Dnª Maria Augusta, nossa única professora
negra, entrou na sala com seu “TD – Livro do Mestre” debaixo do braço e deu um
olhar rasante por sobre os óculos de armação quadrada, conferindo rosto por
rosto as próximas vítimas da Matemática... já sabíamos de antemão que era uma
professora severa, portanto a conversa dentro da sala murchou, feneceu... como
se murcha uma flor atirada no asfalto.
A passos decididos, marchou até a “mesa do
tribunal”... e vi naqueles olhos severos e duros, uma persistência, sagacidade
e inteligência dignas do Ministro Joaquim Barbosa!!!
DENTRO DA SALA: Todos de pé, não cantávamos o Hino
Nacional nem batíamos continência, mas Dnª Maria Augusta puxava o Ave Maria e a
Oração de São Francisco, de quem era muito devota.
Meu pior vexame aconteceu certa vez depois do
Recreio: Por causa da CAMPANHA ANTI-CÁRIES, tínhamos de "bochechar"
água com flúor e eu acabei engolindo aquela solução. Quando levantamos pra
rezar, meu estômago deu aquela reviravolta, e toda sopa que comi no recreio veio
parar na boca. E eu com medo da professora tapei a boca com as mãos... Aguentei
assim até o meio da reza, depois "lavei" o chão e os pés dos meus
coleguinhas!!
Imediatamente corri pra fora da sala e só voltei
depois da aula terminada, com cara de cachorrinho que entornou o penico...
Após a chamada – onde se ouvia apenas o nome do
aluno e a resposta: __”Presente!” e nem um zumzum de mosquito a mais – Dnª
Maria Augusta apresentou aquele que seria nosso melhor amigo nas horas, dias e
até semanas de apuro antes das provas: O FAMOSO LIVRO TD – Trabalho Dirigido,
do autor Scipione de Pierro Neto, com capa de cor amarela pra 5ª série. E se
sobrevivêssemos, teríamos o de capa vermelha pra 6ª, e verde-escura pra 7ª
série.
Matemática com Dnª Maria Augusta só tinha duas
opções: Ou o aluno aprendia, ou aprendia. Ela não admitia que aluno seu não
entendesse a matéria. Nada de brincadeiras em sala de aula: Raiz quadrada, sim.
Mas quadradinho de oito, nem pensar...
Dias de tomar tabuada dava um nervoso tão grande na
gente, que alguns alunos até desandavam o intestino, tal era a expectativa e o
terror de não saber responder “na ponta da língua” como a professora queria! A
cabeça tem de agir rápido e numa habilidade que eu mesmo desconhecia, nessas
horas conseguia lembrar da tabuada todinha, além do abecedário completo! Ser
chamado lá na frente em grupos de dez alunos, perfilados ao lado do
quadro-negro, esperando Dnª Maria Augusta se aproximar com a ponta da régua
batendo na palma da mão e perguntar aleatoriamente: “7x8”, ou então aquela
história dos “noves fora”... Ai, ai, era mesma coisa que me apresentar pra
fazer triagem na Fila do Juízo Final...
Mas ela era assim mesmo... Severa dentro da Escola,
não diferente lá fora: Eu não fiz parte do grupo que espalhava flores nas ruas
no dia de Corpus Christi... mas Jesus Christim, como era perfeccionista!!
Nilcimar Assis me contou que os piores beliscões que já levou na vida, foram de
Dnª Maria Augusta, que não admitia uma falha nem um gesto errado das meninas
nessa hora tão importante pra ela! A Soninha também falou que no seu tempo de
aluna, Dnª Maria Augusta só passava lição de moral nas meninas – coisa que elas
deveriam agradecer muito a professora, eu acho – pois todas viraram moças muito
prendadas, depois de crescidas!!
Dnª Maria Augusta que nunca se casou e nem teve
filhos, era assim: Sabia ser dócil e de uma ternura de mãe – daquelas mães
severas, bem entendido – ou então se alguém pisasse na bola, de repente sofria
uma explosão de fúria e coitado do menino ou menina que estivesse na frente!
Possivelmente ia a nocaute, SÓ DE SUSTO!
O que vou contar agora não aconteceu na minha sala,
mas como NOTÍCIA BOA corria veloz no Ginásio, diziam que certo dia um aluno no
fundo da sala esqueceu que estava em aulas de matemática, e começou conversar
alto... Ah! Pra quê ? A professora atirou o apagador em sua direção. E acertou
no alvo, porque seus cálculos eram matemáticos!!! Nem adiantava desviar, que o
apagador acertava assim mesmo...
Se estávamos sentados enquanto Dnª Maria Augusta
explicava equação e displicentemente um aluno apoiava os pés no travessão que
passa por baixo da carteira... Já era suficiente! Interrompia imediatamente a
aula e logo gritava:
__"Ó o Pé de LOO-BO, minino!!!!" ( todo
mundo pra ela era "minino" )... e até quem não tinha pecado encolhia
os pés rapidinho e os escondia por detrás da cadeira...
No final do bimestre Dnª Maria Augusta sentia dó e
nos dava uma chance – a única e salvadora chance pra não tirar notas vermelhas;
Era assim: Na hora de conferir as notas em seu diário, ordenava aos alunos que
mostrassem o caderno pra ver se estava tudo em ordem. E nesta hora, pedia que
cada um de nós escrevesse no rodapé da última folha escrita, a nossa "NOTA
DE CARÁTER". Era um segredo entre o aluno e ela. Cada aluno deveria fazer
uma justa reflexão e marcar ali quanto ele ACHAVA QUE MERECIA... Não preciso
nem dizer que os mais travessos eram os cara-de-pau que pediam a nota mais
alta, não é?
Dnª Maria
Augusta tinha lá suas manias: Ao longo do ano, pediu que cada aluno levasse uma
CHAVE pra ela. E todos nós atendemos seu pedido. Teve chaves de casa, chaves de
cadeado e até chave de um Jipe velho apareceu por lá. É que Dnª Maria Augusta
fazia coleção de chaves... talvez num desejo secreto de abrir o coração de seus
pupilos e depositar dentro deles um pedacinho da professora, para quando
saíssem da escola, pudessem lembrar dela... E depois dessa mania de colecionar
chaves, teve família em Guapé que dormiu de portas abertas por não encontrar as
chaves de casa!!
Dnª Maria Augusta também foi emotiva: No último ano
que estudei com ela, nos pediu um pedaço de tecido do tamanho da palma de
nossas mãos, e com esse tecido ela fez uma linda COLCHA DE RETALHOS! Ela nos
falou que toda vez que olhasse para aquela colcha, lembraria de cada um de nós,
representados no tecido que trouxemos. Escreveu o nome de todos alunos... Dizem
que nas noites escuras em seu quarto sozinha, dormia enrolada na colcha, a
lembrar de suas crianças do Ginásio, como uma mãe dorme na companhia de seus
filhos...
Dnª Maria Augusta já se foi. Carregou por toda vida
o carinhoso apelido de "Gôia" - mas a gente só falava longe dela.
Levou consigo a certeza de que o melhor livro de matemática do mundo era o
TD... Agora está lá: Nossa querida e única professora Negra, quebrando a
monotonia de um Paraíso onde os artistas cismam de pintar só gente branca de
olhos azuis... Será que conseguiu também as chaves de S.Pedro pra coleção???
Dnª Maria Augusta, guardo tanta saudade da senhora!... Deixou um pedaço grande de
lembranças no meu coração.
By Marcelo Lagoa,uai!!!
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