quarta-feira, 15 de abril de 2015

11º Dona Maria Augusta

04/12/2013
 ''AI!!! QUE SAUDADE ME DÁ !!!"


Pretendo descrever com AMOR – mas também com HUMOR – as lembranças que guardo da querida professora de matemática, Dnª Maria Augusta. Espero alcançar tal objetivo.

Nunca fui aluno “brilhante” em Matemática... Calculadora portátil não era permitido – e mesmo que fosse, só o Antônio Pio, irmão do Gêra que vendia a preço de ouro, pois era o único que se arriscava ir no Paraguai pra buscar. E até hoje só conheço de cor as tabuadas de 2, de 5 e de 10...

No Ginásio acabaram-se os "Problemas" – os tais exercícios de matemática que aprendíamos no Grupo, que eram umas histórias de 2 ou 3 linhas e depois vinha um “quadradinho” por linha, na frente de cada etapa dos cálculos.
A coisa mudou bastante no Ginásio e pra começar, mudou até de nome: Virou "Equação"... e até hoje penso que Dnª Maria Augusta pegou pesado com a gente... Seu modo de ensinar era “ESTILO MILITAR”, e a primeira visão nos deixou apreensivos: Surgiu uma senhora corpulenta, sem nenhum traço de sorrisos no rosto. Dnª Maria Augusta, nossa única professora negra, entrou na sala com seu “TD – Livro do Mestre” debaixo do braço e deu um olhar rasante por sobre os óculos de armação quadrada, conferindo rosto por rosto as próximas vítimas da Matemática... já sabíamos de antemão que era uma professora severa, portanto a conversa dentro da sala murchou, feneceu... como se murcha uma flor atirada no asfalto.
A passos decididos, marchou até a “mesa do tribunal”... e vi naqueles olhos severos e duros, uma persistência, sagacidade e inteligência dignas do Ministro Joaquim Barbosa!!!

DENTRO DA SALA: Todos de pé, não cantávamos o Hino Nacional nem batíamos continência, mas Dnª Maria Augusta puxava o Ave Maria e a Oração de São Francisco, de quem era muito devota.
Meu pior vexame aconteceu certa vez depois do Recreio: Por causa da CAMPANHA ANTI-CÁRIES, tínhamos de "bochechar" água com flúor e eu acabei engolindo aquela solução. Quando levantamos pra rezar, meu estômago deu aquela reviravolta, e toda sopa que comi no recreio veio parar na boca. E eu com medo da professora tapei a boca com as mãos... Aguentei assim até o meio da reza, depois "lavei" o chão e os pés dos meus coleguinhas!!
Imediatamente corri pra fora da sala e só voltei depois da aula terminada, com cara de cachorrinho que entornou o penico...

Após a chamada – onde se ouvia apenas o nome do aluno e a resposta: __”Presente!” e nem um zumzum de mosquito a mais – Dnª Maria Augusta apresentou aquele que seria nosso melhor amigo nas horas, dias e até semanas de apuro antes das provas: O FAMOSO LIVRO TD – Trabalho Dirigido, do autor Scipione de Pierro Neto, com capa de cor amarela pra 5ª série. E se sobrevivêssemos, teríamos o de capa vermelha pra 6ª, e verde-escura pra 7ª série.


Matemática com Dnª Maria Augusta só tinha duas opções: Ou o aluno aprendia, ou aprendia. Ela não admitia que aluno seu não entendesse a matéria. Nada de brincadeiras em sala de aula: Raiz quadrada, sim. Mas quadradinho de oito, nem pensar...
Dias de tomar tabuada dava um nervoso tão grande na gente, que alguns alunos até desandavam o intestino, tal era a expectativa e o terror de não saber responder “na ponta da língua” como a professora queria! A cabeça tem de agir rápido e numa habilidade que eu mesmo desconhecia, nessas horas conseguia lembrar da tabuada todinha, além do abecedário completo! Ser chamado lá na frente em grupos de dez alunos, perfilados ao lado do quadro-negro, esperando Dnª Maria Augusta se aproximar com a ponta da régua batendo na palma da mão e perguntar aleatoriamente: “7x8”, ou então aquela história dos “noves fora”... Ai, ai, era mesma coisa que me apresentar pra fazer triagem na Fila do Juízo Final...

Mas ela era assim mesmo... Severa dentro da Escola, não diferente lá fora: Eu não fiz parte do grupo que espalhava flores nas ruas no dia de Corpus Christi... mas Jesus Christim, como era perfeccionista!! Nilcimar Assis me contou que os piores beliscões que já levou na vida, foram de Dnª Maria Augusta, que não admitia uma falha nem um gesto errado das meninas nessa hora tão importante pra ela! A Soninha também falou que no seu tempo de aluna, Dnª Maria Augusta só passava lição de moral nas meninas – coisa que elas deveriam agradecer muito a professora, eu acho – pois todas viraram moças muito prendadas, depois de crescidas!!

Dnª Maria Augusta que nunca se casou e nem teve filhos, era assim: Sabia ser dócil e de uma ternura de mãe – daquelas mães severas, bem entendido – ou então se alguém pisasse na bola, de repente sofria uma explosão de fúria e coitado do menino ou menina que estivesse na frente! Possivelmente ia a nocaute, SÓ DE SUSTO!

O que vou contar agora não aconteceu na minha sala, mas como NOTÍCIA BOA corria veloz no Ginásio, diziam que certo dia um aluno no fundo da sala esqueceu que estava em aulas de matemática, e começou conversar alto... Ah! Pra quê ? A professora atirou o apagador em sua direção. E acertou no alvo, porque seus cálculos eram matemáticos!!! Nem adiantava desviar, que o apagador acertava assim mesmo...

Se estávamos sentados enquanto Dnª Maria Augusta explicava equação e displicentemente um aluno apoiava os pés no travessão que passa por baixo da carteira... Já era suficiente! Interrompia imediatamente a aula e logo gritava:
__"Ó o Pé de LOO-BO, minino!!!!" ( todo mundo pra ela era "minino" )... e até quem não tinha pecado encolhia os pés rapidinho e os escondia por detrás da cadeira...

No final do bimestre Dnª Maria Augusta sentia dó e nos dava uma chance – a única e salvadora chance pra não tirar notas vermelhas; Era assim: Na hora de conferir as notas em seu diário, ordenava aos alunos que mostrassem o caderno pra ver se estava tudo em ordem. E nesta hora, pedia que cada um de nós escrevesse no rodapé da última folha escrita, a nossa "NOTA DE CARÁTER". Era um segredo entre o aluno e ela. Cada aluno deveria fazer uma justa reflexão e marcar ali quanto ele ACHAVA QUE MERECIA... Não preciso nem dizer que os mais travessos eram os cara-de-pau que pediam a nota mais alta, não é?

Dnª  Maria Augusta tinha lá suas manias: Ao longo do ano, pediu que cada aluno levasse uma CHAVE pra ela. E todos nós atendemos seu pedido. Teve chaves de casa, chaves de cadeado e até chave de um Jipe velho apareceu por lá. É que Dnª Maria Augusta fazia coleção de chaves... talvez num desejo secreto de abrir o coração de seus pupilos e depositar dentro deles um pedacinho da professora, para quando saíssem da escola, pudessem lembrar dela... E depois dessa mania de colecionar chaves, teve família em Guapé que dormiu de portas abertas por não encontrar as chaves de casa!!

Dnª Maria Augusta também foi emotiva: No último ano que estudei com ela, nos pediu um pedaço de tecido do tamanho da palma de nossas mãos, e com esse tecido ela fez uma linda COLCHA DE RETALHOS! Ela nos falou que toda vez que olhasse para aquela colcha, lembraria de cada um de nós, representados no tecido que trouxemos. Escreveu o nome de todos alunos... Dizem que nas noites escuras em seu quarto sozinha, dormia enrolada na colcha, a lembrar de suas crianças do Ginásio, como uma mãe dorme na companhia de seus filhos...

Dnª Maria Augusta já se foi. Carregou por toda vida o carinhoso apelido de "Gôia" - mas a gente só falava longe dela. Levou consigo a certeza de que o melhor livro de matemática do mundo era o TD... Agora está lá: Nossa querida e única professora Negra, quebrando a monotonia de um Paraíso onde os artistas cismam de pintar só gente branca de olhos azuis... Será que conseguiu também as chaves de S.Pedro pra coleção??? Dnª Maria Augusta, guardo tanta saudade da senhora!... Deixou um pedaço grande de lembranças no meu coração.


By Marcelo Lagoa,uai!!!

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