quarta-feira, 15 de abril de 2015

14º Coração Amargurado

26/01/2014
Coração Amargurado

Hoje, revirando álbuns de meus amigos, olhando fotos antigas e matando saudades, busquei notícias de pessoas e amigos que há muito tempo não via, pessoas que o passado de duas décadas e meia nos tornou longínquos – ainda que distantes fisicamente e no tempo, mas guardados no coração.
Lembro de quando trabalhei na Fazenda, em Volta Grande, lembro de quando fui encarregado de levar adubo com trator e carreta, e distribuí-lo nas sacolas dos trabalhadores braçais, que percorriam rua por rua aquele enorme, gigantesco cafezal, espalhando Ureia e Cloreto de Potássio sob os pés de café...

Lembro que ela foi deficiente desde o nascimento, e tinha dificuldades de andar por causa de um de seus pés... E se hoje reclamamos das calçadas imperfeitas e das ruas asfaltadas, imagina naquele tempo, a situação de quem tinha dificuldades de locomoção, mas precisava enfrentar a roça pra sobreviver!! percorrer a lavoura muitas vezes em declive, com as roupas em farrapos, carcomida pelo adubo, carregando uma sacola quente de plástico à tiracolo, cheia de adubo pra espalhar no solo do cafezal... Mas ela enfrentava assim mesmo, foi muito corajosa e responsável, cuidava da casa onde seu pai “Tião Chiquinha” adoecido sem poder trabalhar, dependia do pão que ela podia trazer pra dentro de casa.
Quando era eu a distribuir o adubo, sempre colocava uma porção bem menor em sua sacola, pois sabia que a dificuldade dela era dobrada, em relação a seus companheiros... MAS COMO EU ADMIRAVA A MARCIONE!! mais nova do que eu naquela adolescência, mulatinha de traços delicados, quase franzina, mas com garra e coragem bem maiores do que muitos rapazes, sempre trabalhando com afinco na imensidão do cafezal, se apoiando no único pé bom que a natureza lhe deu... Não abria a boca pra nada, não reclamava.
Mesmo quando não era eu, mas sim outro peão que levava o adubo para o meio da roça – e insensível – carregava sua sacola com mesmo tanto dos outros sem se aperceber das dificuldades que ela enfrentava, mesmo assim ela sempre lutou pra acompanhar suas companheiras e fazer jus ao minguado salário da roça, sem nunca reclamar, sem nunca desistir...

Então hoje conversando com a Elizabeth Sallum, cujo pai tem fazenda por lá, buscando notícias de todo mundo, ao perguntar também sobre ela, esperava ouvir qualquer coisa, esperava ouvir que se mudou pra cidade, ou que permanecera na roça, que estava casada, viúva ou solteira, que tinha filhos e uma bonita família, que tinha melhorado de vida e até ficado rica. Ou continuado pobre, cuidando de seu pai doente... Esperava até ouvir que continuava do mesmo jeito de sempre...
Esperava ouvir tudo, mas não esperava jamais ouvir que já fazem dois anos que faleceu... Deixou quatro filhos no mundo.
Pra alguns a vida é longa e suave. Mas pra outros, pode ser curta e cheia de espinhos...
E dói bastante receber essas notícias...

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